sexta-feira, 27 de julho de 2012

Rayuela (um pouco modificado)


Acordei e vi a luz do amanhecer pelas frestas. Saía tão de dentro da noite que tive como um vômito vindo de mim, o espanto de entrar num novo dia com sua mesma apresentação, com sua indiferença mecânica de sempre: consciência, sensação de luz, abrir os olhos, persiana, a madrugada.

Nesse segundo, com a onisciência do semi-sonho, medi o horror daquilo que tanto maravilha e encanta as religiões: a perfeição eterna do cosmos, a rotação incessante do globo sobre o seu eixo. Náusea, sensação insuportável de coação. Sou obrigada a tolerar que o sol saia todos os dias. É monstruoso. Não é humano.

Antes de voltar a dormir, imaginei (vi) um universo plástico, mutante, cheio de maravilhosos acasos, um céu elástico, um sol que inesperadamente falta, ou fica imóvel, ou muda de forma.

Ansiei pela dispersão das duras e inflexíveis constelações, essa suja propaganda luminosa do destino.

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